Doação de livro infantil vira pena alternativa

Quem se envolver em crimes leves em Presidente Venceslau, no extremo oeste paulista, terá a chance de optar pelo pagamento de uma pena alternativa inédita no País: a doação de livros infantis para os cerca de 4 mil alunos das 16 escolas municipais. O autor da ideia é o juiz Silas Silva Santos, de 33 anos, titular da 1.ª Vara Judicial do Fórum de Presidente Venceslau.

A doação de livros substitui outras penas alternativas, como doação de cestas básicas, prestação de serviços comunitários e pagamento de multas. Para escapar de processos, 24 interessados aderiram à proposta do magistrado desde março.

Até agora, 14 acusados doaram 648 livros infantis à Secretaria Municipal de Educação.

"Não há condenação, não há confissão de culpa quando o sujeito adere a essa transação. Há um ajuste entre o autor da infração e o Ministério Público, justamente para evitar o processo e uma eventual pena criminal mais grave", explica o juiz, lembrando que os envolvidos têm interesse em aderir ao programa porque ficam sem antecedentes criminais. "Quando o sujeito adere não fica registrado antecedente."

Crimes leves. Serão beneficiados os acusados de crimes leves, como calúnia, desacato e lesões corporais leves, condenados a até 2 anos de prisão.

Além dessas exigências, a medida beneficia réus primários com bons antecedentes.

"Eu entrego uma lista de livros e ele (acusado) próprio entrega na secretaria. Nós optamos por transformar essa prestação de serviço no que eu chamaria de cesta de livros. O objetivo é formar bibliotecas municipais", diz Silva Santos.

Até agora, nenhum dos acusados doou menos de dez livros. "Um doou 18", conta Aldora Maia Veríssimo, de 58 anos, secretária de Educação. "Ele gastou R$ 117", diz, acrescentando que outro comprou 48 livros por R$ 409, uma das maiores doações até o momento. A maior, porém, foi a de um acusado que gastou mais de R$ 1 mil. O volume da compra leva em conta o poder aquisitivo e o delito cometido.

Quem adere ao programa compra coleções de livros de vários autores na única livraria da cidade. Entre as obras estão A Nuvem e a Duna, de Cristina Oiticica, Os Tais Esdrúxulos, de Tatiana Belinky, e os clássicos contos infantis de Hans Christian Andersen. "A lista é ampla", resume a secretária.

Audiência
A Corregedoria da Polícia Civil vai ouvir, pela primeira vez, a população em uma audiência pública, hoje, em Assis. Se for constatada irregularidade, será instaurado procedimento de apuração.
FONTE:Jornal O Estadão

Cultura nacional:Literatura

Renato Araújo/ABr O cinquentenário da capital do país inspirou o tema da 28ª Feira do Livro de Brasília
O Brasil é um país rico em manifestações populares e a literatura está entre elas. Por meio das obras escritas, é possível encontrar textos, estilos e autores que retratam a cultura do povo. A literatura brasileira foi marcada por estilos e tendências, que refletiam a realidade do país em diferentes épocas.

Desde Machado de Assis a Paulo Coelho, passando por Clarice Lispector e Jorge Amado, o Brasil sempre teve espetaculares escritores dos mais diversos estilos. Suas obras foram traduzidas para diversos idiomas e Paulo Coelho, por exemplo, está hoje entre os mais populares do mundo, com mais de 100 milhões de livros vendidos em todo o planeta.

Dados sobre a leitura no Brasil

• Apesar de a prática da leitura ser considerada importante fator para o acesso à cultura e à cidadania, dados atuais do IBGE mostram que:

• O brasileiro lê em média 1,8 livros por ano, contra 2,4 na Colômbia e sete na França.

• 73% dos livros estão concentrados nas mãos de apenas 16% da população.

• O preço médio do livro é R$ 25,00, muito elevado quando se compara com a renda do brasileiro nas classes C/D/E.

• Dos cerca de 600 municípios brasileiros que nunca receberam uma biblioteca, 405 ficam no Nordeste, e apenas dois no Sudeste.

• O governo investe com ações para mudar esse quadro e incentivando a leitura em diversas fontes. Na Internet, o site Domínio Público disponibiliza centenas de títulos nos mais diversos estilos para download gratuito.

• Através dos tempos, diversos estilos literários marcaram época no Brasil. Conheça alguns deles.

Quinhentismo (século XVI)

Representa os primórdios da “literatura” no Brasil. Ganhou o nome pela fato de que as primeiras manifestações chamadas de literárias ocorreram no começo da colonização, nos primeiros anos de 1 500. Duas figuras são destacadas nesta fase, o padre José de Anchieta, e o escrivão Pero Vaz de Caminha.

O padre Anchieta, que aportou no Brasil com a missão de catequizar os nativos, deixou poemas, autos, sermões, cartas e hinos. Todo este espólio foi resultado do trabalho religioso de Anchieta de levar a Igreja até os primitivos habitantes do Brasil.

Pero Vaz de Caminha, o escrivão da frota de Pedro Álvares Cabral, por meio de suas cartas e seu diário, elaborou uma literatura de Informação ( de viagem ) sobre o Brasil. O objetivo de Caminha era informar o rei de Portugal sobre as características geográficas, vegetais e sociais da nova terra.

Barroco

Linguagem extravagante, carregada de metáforas (dizer uma idéia com outras palavras) e antíteses (sentidos opostos) para mostrar os conflitos entre a alma e o corpo. Destaque para o baiano Gregório de Matos.

Arcadismo

Estilo que valoriza a razão e a linguagem simples com temas ligados ao campo. Nessa fase, os poetas usam a ordem direta. Também era permitido o uso do verso branco, isto é, sem rimas. Entre os principais autores estão Tomás Antonio Gonzaga e Alvarenga Peixoto.

Realismo

Linguagem impessoal e objetiva, que explora os perfis psicológicos dos personagens e o lugar deles na sociedade. Machado de Assis é um dos representantes desse movimento.

Naturalismo

Mesmo período do realismo, com características parecidas, mas de linguagem mais explícita. Destaque para Aluísio de Azevedo, autor de O Cortiço.

Parnasianismo

Para os autores deste estilo, o importante é a arte pela arte, versos perfeitos, rimas ricas e muito comportadas. Entre os principais está o poeta Olavo Bilac.

Simbolismo

Inspirado em obras francesas, fala de espiritualidade com muitas metáforas, em poemas que parecem descrições de sonhos. Destaque para Cruz e Sousa.

Pré-modernismo

O traço em comum dos escritores nesse estilo é ser diferente. É a preparação para a revolução modernista. Entre os destaques estão Augusto dos Anjos, Euclides da Cunha e Lima Barreto.

Modernismo

Valoriza linguagem cotidiana, a liberdade de expressão e a brasilidade. O grande marco é a Semana de Arte Moderna de 1922. Mário de Andrade, Oswald Andrade, Carlos Drummond de Andrade, Graciliano Ramos, Jorge Amado e Érico Verissimo são os grandes representantes dessa geração.

Autores contemporâneos

Nas últimas décadas não há movimentos claramente identificados ou autodenominados. É como se cada autor estivesse trilhando o seu caminho. Destaque para Guimarães Rosa, Rubem Fonseca e Carlos Heitor Cony.

Fonte:www.brasil.gov.br Minc/Programa Mais Cultura/Mundo Cultural



Raimundo Carrero é o vencedor do Prêmio São Paulo de Literatura

O escritor pernambucano Raimundo Carrero é o grande vencedor da terceira edição do Prêmio São Paulo de Literatura, na categoria Melhor livro do ano. A obra contemplada é A minha alma é irmã de Deus (2009). Carrero concorreu com nomes como João Ubaldo Ribeiro, Chico Buarque, Bernardo Carvalho e Paulo Rodrigues.

O resultado foi divulgado na noite desta segunda-feira (2), em cerimônia realizada no Museu da Língua Portuguesa, em São Paulo. O prêmio, concedido pelo Estado de São Paulo, através da Secretaria de Cultura, contempla cada vencedor com R$ 200 mil.
O júri da premiação foi composto por Luís Felipe Pondé, Plínio Martins, Walther Moreira Santos, Moacyr Scliar e Valentim Facioli.

Na categoria Melhor livro do ano - autor estreante, o vencedor foi Edney Silvestre, com o livro Se eu fechar os olhos agora.
A minha alma é irmã de Deus fecha a tetralogia Quarteto Áspero, iniciada em 1989, com Maçã do Agreste e continuada com Somos pedras que se consomem (1995) e O amor não tem bons sentimentos (2007).

O jornalista e escritor Raimundo Carrero tem 17 livros publicados. Vencedor de vários prêmios de grande reconhecimento nacional, entre eles o Jabuti e o Prêmio Machado de Assis (este por duas vezes - em 1995 e 2009). Carrero é colunista da rádio JC/CBN, integrante do Sistema Jornal do Commercio de Comunicação, onde, de segunda a sexta-feira, participa do programa CBN Total, apresentado por Aldo Vilela, com comentários sobre literatura.
Fonte:Jornal do Commercio

"Está na hora de São Paulo aprender que os nordestinos estão, de fato, invadindo a cidade", brincou Carrero, ao se referir ao ganhador do ano passado, o cearense Ronaldo Correia de Brito, que venceu por "Galiléia" (Alfaguara). "Estamos produzindo uma literatura desprovida de folclore e muito calcada nos relacionamentos humanos." (Fonte:Estadão)

LEIA COMENTÁRIO DE CARRERO

“A minha alma é irmã de Deus” é um romance da juventude sem identidade"

"Fazia tempo estas palavras queimavam os meus dedos. E a minha alma. Elas vinham da Bíblia e ficavam ali diante dos meus olhos, no papel, e pediam para pulsar no meu texto. Até que Camila, a menina que sonha ir para o céu a fim de desfilar no exército das onze mil virgens, ouvia-as. Estava só e abandonada, na imensa solidão da noite recifense, empurrando uma carroça vazia, sem comida. O narrador inominado que a acompanha lembra, em meio aos faróis acesos dos carros e das portas que se fecham a cada uma das suas amarguras, nas ruas do Recife, que ela “tem que dormir no terreno ao lado da casa. E ainda ouve as batidas do martelo. Nem mesmo teria jantar. Que palavra estranha. Sempre palavra. Palavras são águias, Camila, palavras são águias no caminho do ar”.

A personagem acaba de perder seu único bem: as ruínas de uma casa desabitada no bairro da Boa Vista, onde dormia e tomava banho. Os operários batem os pregos nos últimos tapumes e ela não pode entrar, mas ainda lhe resta última esperança: o lixo, onde se deitará para dormir. Expulsa de casa, expulsa da vida. Procura um papel para se cobrir, e o narrador, que a acompanha e com quem conversa, procura ainda as derradeiras palavras que a consolem, dizendo que o jantar – não comera um único pão durante o dia - é apenas uma palavra. E o que é uma palavra, enfim? Uma palavra é indecifrável, um enigma, uma esfinge, tão misteriosa quanto o caminho de uma águia no ar procurando alimentos. Mesmo bela, superiora e a voar, valente, desenha riscos que não podem ser classificados.
Quando comecei a pensar em “A minha alma é irmã de Deus”, romance agora lançado pela Editora Record, do Rio de Janeiro, a personagem Camila se impôs com a sua rebeldia e a sua generosidade. Nascia como nasce a maioria dos meus personagens: de uma página de jornal. Cedo da manhã lendo, descobria-a: ela estava ali, completa, embora apenas os olhos – dois olhinhos inquietos e sofridos – aparecessem numa foto colorida, mas cheia de sombras. Era o dia 9 de março de 2006. A matéria contava a história de uma menina de doze anos que vivia nas estradas, prostituída, e que se tornara amante de um caminhoneiro. Preguei o recorte no meu álbum e garanti: ela vai me acompanhar durante, pelo menos, dois anos. Errei por um ano. Ela ficou três anos. Aliás, nunca mais vai sair de mim.
Fiquei, também eu, marcado, a ferro e fogo, pela trajetória da menina, no início era apenas uma menina até envelhecer, e pelas inquietantes palavras que a acompanhavam enquanto sofria fome e sede, abandonada da sorte, esquecida pelo destino, embora animada por um fiapo de esperança. Ela vai se tornando cada vez mais calada, cada vez mais silenciosa, cada vez mais humilhada, até que se encontra naquela situação em que só pode ser consolada pelo caminho das águias. Nenhum gemido, nenhum ruído, só a vida com o seu sentimento de adeus. Permanente sentimento, revelado no parágrafo:

“Havia silêncio para cada coisa – ela aprendeu muito cedo na vida. Silêncio para janela, silêncio para porta, silêncio para cadeados, silêncio para lixo, silêncio para silêncio. Silêncio. Sumindo, muito devagar, com os ventos, tudo muito devagar, lentamente. Afundando na noite, sempre afundando, a noite do Recife coberta pelo silêncio. Pelas ruínas. Pelo silêncio da noite, pelas ruínas trancadas. O silêncio do Recife parece se espalhar e escurecer. Porque nessa hora todo silêncio é escuro. Por isso é ainda mais silêncio. Todo esse silêncio do Recife. Um silêncio que naufraga, afunda, some. E com ele, as pessoas. E as pessoas vão entrando no silêncio, no Recife, e começam a sumir. As pessoas somem tragadas pelo silêncio. Bem devagar, muito devagar, elas somem. E pronto. É assim que o mundo vai embora?”

De certa forma, este é o mundo que povoa a alma de Camila, seqüestrada pelos “Soldados da pátria por Cristo”, uma seita religiosa criada por Leonardo, um homem bêbado, que anda faminto pelas ruas, e toca saxofone nas calçadas sempre que tem fome e sede. É acompanhado pelas irmãs Raquel e Ísis, que também são suas amantes,
e pela quieta Mariana, uma mulher do sertão, cujo principal traço é a humildade, incapaz de falar enquanto não é ordenada. E, ao lado deles, patético e sóbrio, o camelô Alvarenga, uma espécie de duende a proteger Raquel, a prostituta que se joga no mundo porque tem um corpo social. Para atrair os fregueses no cabaré, Alvarenga toca uma corneta com toque marcial e é presenteado por Raquel com um peixinho de chocolate, que ele recebe nas pontas dos pés, como se fosse uma foca amestrada. Vivem em ruínas nos bairros do Recife, até que são expulsos. E logo procuram outra ruína, e mais outra, e mais outra, circulando sempre entre ruínas, silêncio e miséria. Mas não deixam de rezar e a gritar “amém?, amém”. Com a indolência de quem não sabe improvisar um sermão.
É claro que, para escrever este livro, recorri a várias técnicas, uma delas atingindo a própria Camila. Em certo sentido, ela é, ao mesmo tempo, Camila, Raquel, Ísis e Mariana, além de uma remota Paloma. Quando precisa ser Raquel, é Raquel, quando necessita ser Ísis – de quem tem muito medo -, é Ísis, e gosta, particularmente, de ser Ísis. A multiplicidade de caráter é também a multiplicidade de corpos. São personagens, na verdade, que vêm de outros romances meus, porque “A minha alma é irmã de Deus” é o quarto romance, que fecha a tetralogia “Quarteto Áspero”, iniciada com “Maçã Agreste”, seguido de “Somos pedras que se consomem” e “O amor não tem bons sentimentos”. De maneira que, para escrevê-lo, fui em busca de outra técnica não muito usual no Brasil e que se chama intratextualidade. Ou seja, usei textos meus de outros romances, assim como fiz em relação a personagens, para formar o tecido literário do livro. Às vezes, por exemplo, tive que trocar nomes de personagens. O caso é de Camila, que se chamava Sofia, em “Maçã agreste”, e que, num romance futuro, pode voltar a ser Sofia, a filha de José. Há, ainda, um intertexto – ou seja, o uso de palavras e frases de outros autores, que dão ao romance aquela universalidade de vozes de que tantos falamos. Sem imitação. Sem uma única imitação.
Além disso, “A minha alma...” procura reunir as técnicas que estudamos em nossa oficina e que estão, didaticamente, em “A preparação do escritor”, publicado pela Editora Iluminuras, e que também está nas livrarias, em lançamento recente. Técnicas que vinha desenvolvendo há muito tempo e que completam meu outro livro “Os segredos da ficção: um guia na arte de escrever narrativas”, da Editora Agir, 2005, Rio de Janeiro.
Mas não vou esquecer nunca aquelas palavras de Emily Dickinson, pronunciadas no pórtico da segunda parte do livro, e que define o caráter de todos os personagens: “Aquilo que chamam de amor é o exílio”. Fonte:raimundocarrero.com.br