Morre o escritor J.D. Salinger, aos 91 anos, nos EUA


Morre o escritor J.D. Salinger, autor de O Apanhador no Campo de Centeio, em New Hampshire. Tinha 91 anos. Era considerado a Greta Garbo da literatura americana e seu romance, mais do que um cult das letras universais, um emblema de uma geração.

O filho do escritor, em um comunicado divulgado pelo representante literário de Salinger, disse que ele morreu de causas naturais. Desde 1953 vivia isolado, por vontade própria, em sua casa em Cornish. Salinger sempre foi avesso a jornalistas, mantendo-se distante das entrevistas e fotos, como aqui no Brasil fazem os escritores brasileiros Rubem Fonseca e Dalton Trevisan.

"Gosto de escrever e asseguro a vocês que escrevo com regularidade", disse Salinger em uma breve entrevista com Baton Rouge Advocate em Luisiana, em 1980. "Mas escrevo para mim mesmo, por prazer. E quero ficar sozinho para escrever".

Salinger foi o autor de um dos maiores clássicos da literatura mundial, o romance O Apanhador no Campo de Centeio, com seu personagem principal marcando gerações com o tipo adolescente, rebelde e atormentado Holden Caulfield. Foi lançado em 1951, em plena Guerra Fria, mas fez sucesso por muitas décadas. O assassino de John Lennon, Mark David Chapman, carregava um exemplar no bolso e pediu um autógrafo do ex-Beatle nele, quando atirou contra Lennon diante do edifício onde morava, em Nova York, em 1980. Depois, disse que a explicação para o que tinha feito estava nas páginas de O Apanhador no Campo de Centeio.

Nascido em 1919, Salinger escrevia para adultos, mas jovens de todo o mundo se identificaram com os temas da alienação, inocência e fantasia de seu romance. Vendeu 65 milhões de exemplares.

Aqui no Brasil O Apanhador no Campo de Centeio é publicado com exclusividade pela Editora do Autor, que no ano passado lançou uma caixa com os três principais livros de Salinger. Além de sua obra-prima, incluia o volume de contos Nove Estórias (1953) e uma novela entitulada Franny & Zooey (1961), reunindo duas histórias publicadas na prestigiada revista New Yorker. A editora carioca fundada por Fernando Sabino (1923-2004), Rubem Braga (1913-1990) e comandada pelo sócio Walter Acosta, de 93 anos, lançou a primeira edição de O Apanhador aqui, em 1965. No ano passado surgiu no mercado uma sequência de seu clássico romance, 60 Years Later: Coming Through the Rye (60 anos mais tarde: passando pelo centeio), de um autor identificado como J.D. Califórnia. Salinger moveu uma ação na Justiça contra autor e editora.

Segundo o jornal The New York Times, muitos críticos gostam mais de Nove Estórias do que de O Apanhador..., como Philip Roth e John Updike, pela ácida crítica social de seus contos, mas especialmente sobre a arquitetura literária de suas histórias curtas, a chamada short story.

Jerome David Salinger nasceu em 1.º de janeiro de 1919, na cidade de Nova York. Seu pai era um importador de queijos e carnes judeu e sua mãe era cristã de origem irlandesa-escocesa; a família viveu por anos em Park Avenue. Como o personagem de seu romance, Holden, Salinger era um estudante com um histórico de problemas em várias escolas. Aos 15 anos, foi enviado para a Academia Militar de Valley Forge, onde escrevia durante à noite à luz de uma lanterna e com o tempo conseguiu seu diploma. Em 1940, publicou seu primeiro texto de ficção, The Young Folks, na revista Story.

Leia trecho de 'O Apanhador no Campo de Centeio'

"- Que maravilhoso encontrar com você! - ela falou. Puro fingimento. - Como vai teu irmão? - perguntou. Era só isso que ela queria saber.
(…)
- Você está sozinho meu querido? - a safada da Lillian perguntou. Ela estava interrompendo a droga do trânsito todo na passagem. A gente via logo que ela gostava um bocado de parar o trânsito. Tinha um garçon esperando que ela saísse da frente, mas ela nem reparou no sujeito. Era engraçado. Estava na cara que o garçon não gostava dela e que nem o cara da Marinha gostava muito dela, embora estivesse saindo com ela. E eu não gostava muito dela. Ninguém gostava. De certa maneira a gente tinha que sentir pena da infeliz.
(…)
- Holden, vem sentar conosco. Traz o teu drinque.

- Não, obrigado. Já estava saindo - respondi. - Tenho um encontro marcado.
(…)
Aí foi embora. O cara da Marinha e eu dissemos que tinha sido um prazer conhecer um ao outro. Esse é um troço que me deixa maluco. Estou sempre dizendo: "Muito prazer em conhecê-lo" para alguém que não tenho nenhum prazer em conhecer. Mas a gente tem que fazer essas coisas para seguir vivendo.

Depois que eu disse a ela que tinha um encontro marcado, não podia mesmo fazer droga nenhuma senão sair. Nem podia ficar por lá para ouvir o Ernie tocar alguma coisa minimamente decente. Mas não ia de jeito nenhum sentar numa mesa com Lillian Simmons e com aquele cara da Marinha e morrer de chateação. Por isso saí. Mas fiquei danado quando apanhei meu sobretudo. As pessoas estão sempre atrapalhando a vida da gente."
FONTE:Teresa Ribeiro do estadao.com.br, com agências internacionais

Escritores brasileiros falam sobre morte de Salinger

RUTH ROCHA, escritora - "Ele foi um autor muito importante, porque conseguiu chegar perto dos adolescentes. Ao fazer seu romance com muita espontaneidade, de forma muito automática, ele conseguiu aquele ritmo, o que deu a ele um sucesso incrível. Eu não tenho muito para falar sobre ele porque li seu romance há muitos anos, e não era mais adolescente. Ou seja: não sofri aquele impacto".

FAUSTO FAWCETT, músico e escritor - "Eu gosto da mitologia que ficou cravada a partir da narrativa do livro O Apanhador no Campo de Centeio, ligada à estranheza do adolescente, da juventude americana. Passei a vida inteira ouvindo falar do livro, o que criou esse fascínio pela mitologia, muito mais do que pelo conteúdo do livro".

JORGE MAUTNER, músico, filósofo e escritor - "O livro dele influenciou muita gente. É meio zen-budista, e isso marcou muito. O zen já aparecia no existencialismo e no movimento beat, mas ele deu uma forma tipicamente norte-americana a essa leitura e criou um certo mito em torno dele próprio. Esse livro andava de mão em mão nos anos 60".

MARÇAL AQUINO, escritor - "Ao contrário da maioria, gosto do Salinger contista. Devo ser um dos pouquíssimos leitores, escritores ou não, que não curtem O Apanhador no Campo de Centeio, talvez por tê-lo lido tardiamente, quando já tinha vinte e pouco anos. E, no fundo, acho uma lástima que esse livro seja tão cultuado a ponto de praticamente impedir que as pessoas conheçam outras obras de Salinger, como o esplêndido Nove estórias, que mostra que ele foi um dos grandes mestres da narrativa curta.

FERREIRA GULLAR, poeta - "Eu li há tantos anos o Apanhador, nem lembro mais. Não tenho a menor ideia do que dizer. Prefiro não me manifestar"

PEDRO CORREA DO LAGO, livreiro, colecionador, editor e autor - "Todo mundo leu O Apanhador no Campo de Centeio, cuja primeira tradução, do Jorio Dauster, é primorosa. Eu não gosto do título, que é uma tradução literal. Dauster depois foi ministro e embaixador. Não me identifico muito com o livro, mas é claro que havia ali preocupações universais de adolescentes. Ele era mais conhecido pela misantropia. Eu presenciei um leilão de um ticket de cartão de crédito assinado por ele, que foi vendido por US$ 1 mil. Era mais cultuado nesse sentido, pelo fato de ter se retirado – embora com menos sucesso do que Thomas Pynchon, que se retirou completamente. Salinger ainda foi fotografado, e entrevistado, e se correspondia com amigos. Batia à máquina suas cartas e eu mesmo, que sou colecionador de correspondências, mantenho alguns textos que ele mandou a amigos. O personagem que ele criou, Holden Caufield, é muito interessante e marcadamente norte-americano. Era um autor legal. Só podia ser: para alguém que escreveu um único livro com esse nível de repercussão, tá bastante bom, não?"
FONTE:estadao.com.br

Um comentário:

  1. Muito interessante Roberto, não conhecia mt bem esse escritor, mas agora tenho um maior conhecimento através dessa postagem! bj

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